China e Moçambique apostam no Vale do Zambeze para fazer “celeiro” chinês, diz investigador

21 July 2008

Pequim, China, 21 Jul – Os governos da China e de Moçambique querem fazer da região moçambicana do Vale do Zambeze um centro de produção de arroz para o mercado chinês, que se deparará com aumentos de consumo e cada vez menos terra arável, afirma o investigador Loro Horta, especialista nas relações entre a China e os países africanos de língua portuguesa.

Afirmando que o interesse chinês pela região do vale do rio Zambeze vem desde 2006, Loro Horta destaca os recentes sinais da relação política entre Pequim e Maputo como um sinal do interesse chinês de longo prazo na exploração agrícola em Moçambique, um plano que Loro Horta diz ser mutuamente benéfico, desde que bem planeado e cumprido.

“Se implementado com sensibilidade, os planos agrícolas da China poderão trazer benefícios tremendos para os dois lados”, afirma Horta, investigador timorense baseado na Universidade Nanyang, de Singapura.

Num artigo publicado em meados de Julho, Loro Horta afirma que o interesse chinês começou a manifestar-se no início do segundo semestre de 2006, quando a China atribuiu a Moçambique, através do banco estatal Exim Bank, um empréstimo de dois mil milhões de dólares para a construção da barragem de Mpanda Nkua, no rio Zambeze a juzante da barragem de Cahora Bassa.

Desde então, segundo Horta, “a China tem vindo a pedir o aluguer de grandes áreas de terreno para estabelecer mega-fazendas e explorações pecuárias geridas por chineses”.

Além de Mpanda Nkua, o investigador lembra também que a China se ofereceu para financiar três outras barragens no Zambeze e outras duas no rio Limpopo, ao mesmo tempo que está a construir novas estradas e a modernizar as infra-estruturas portuárias de Guelimane e Nacala, nas províncias da Zambézia e de Nampula, respectivamente.

“Este investimento em infra-estruturas é claramente designado para maximizar a produção e facilitar a rápida exportação de bens alimentares para a China, atribuindo ao mesmo tempo lucrativos contratos a empresas chinesas”, considera Horta.

“A China atribuiu recursos significativos à melhoria da produção agrícola, com o arroz como principal prioridade. No início de 2008, o governo chinês prometeu investir 800 milhões de dólares na modernização da agricultura moçambicana, com o objectivo e aumentar a produção de arroz das 100 mil toneladas para as 500 mil toneladas por ano nos próximos cinco anos”, acrescenta.

Segundo estatísticas oficiais chinesas, o consumo de arroz na China duplicou entre 1985 e a actualidade, para 50 quilos por pessoa, em consequência do crescimento económico do país.

Ao mesmo tempo que a quantidade de área arável se reduz cada vez mais na China devido ao aumento do tamanho das cidades e zonas residenciais e à degradação ambiental, a terra é cada vez mais disputada para assegurar a produção de outras culturas, como a soja, o açúcar e os cereais, cujo consumo aumentou mais de 30 por cento na última década.

“O crescente aumento da procura alimentar e o rápido desaparecimento de terra arável (…) fazem da descoberta de novos terrenos agrícolas uma prioridade para o governo chinês”, considera Loro Horta, acrescentando que “a China está apostada em transformar Moçambique num dos seus principais fornecedores de alimentos, em especial de arroz, a base da alimentação chinesa”.

Horta prevê que a expansão chinês ano domínio do arroz em Moçambique tenha início com a emigração de cerca de um milhar de chineses para o vale do Zambeze numa tendência a observar nos próximos anos. A mão-de-obra chinesa, afirma, vai operar equipamentos agrícolas avançados e gerir as grandes fazendas e a infra-estrutura de irrigação, com os trabalhadores moçambicanos a assegurar as tarefas manuais mais pesadas.

Quanto ao controlo da terra – que é estatal e portanto não pode ser vendida ou alugada – o investigador prevê a criação de parcerias com entidades moçambicanas que serão “parceiros mudos” com os sócios chineses a assegurar a gestão do negócio.

“O aumento da produção de arroz em Moçambique destina-se claramente às exportações para o mercado chinês, uma vez que o arroz representa apenas uma fracção mínima da dieta moçambicana e é sobretudo consumido pelos ricos nas grandes cidades. Mais de 90 por cento da população do país depende da mandioca e da shima (flor de mandioca), milho e amendoins”, afirma.

Loro Horta diz também que “Moçambique espera receber o pagamento das exportações de arroz em divisas que, por seu turno, lhe vão permitir comprar bens produzidos na China e outras matérias-primas no mercado global”.

É também com este objectivo, afirma, que Maputo e Pequim acordaram criar em Moçambique um instituto de investigação em agricultura avançada – com verbas chinesas – bem como outras escolas agrícolas um pouco por todo o país.

Outros projectos financiados pela China incluem redes de canais de irrigação, para além da deslocação a Moçambique de mais de 100 peritos chineses incluindo uma equipa do Instituto de Arroz Híbrido de Hunan, um dos melhores institutos de investigação sobre o sector em toda a China. (macauhub)

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