Macau, China, 29 Dez – China e países de língua portuguesa superaram a meta de 2009 para as trocas comerciais já em 2008, ano em que Angola foi protagonista por assumir papel-chave na economia portuguesa e por conseguir um reforço da ajuda financeira chinesa.
Os últimos dados dos serviços de alfândegas da China indicam que o valor das trocas entre a China e os “oito” países de língua portuguesa foi superior a 68 mil milhões de dólares de Janeiro a Outubro, mais 89,5 por cento do que no mesmo período de 2007, crescimento impulsionado principalmente pelo Brasil e Angola.
O ritmo de crescimento denota um abrandamento muito ligeiro em relação ao alcançado até Junho (91,5 por cento), traduzindo a descida do preço internacional das matérias-primas, que tem vindo a recuar fortemente nos últimos meses, com destaque para o petróleo, base nomeadamente das trocas com Angola, as segundas mais importantes entre os “oito”.
Angola e Brasil, os dois mais importantes parceiros comerciais para a China neste espaço, foram os países que mais viram as suas trocas aumentar nos primeiros dez meses do ano: 122 por cento e 81 por cento, respectivamente.
Todos os países registaram aumentos de dois dígitos face ao período homólogo, à excepção de Timor Leste e de Cabo Verde, que registaram ambos variações negativas.
Fica assim superada a meta definida para as trocas comerciais multilaterais – 50 mil milhões de dólares em 2009 – mas a descida acentuada do preço da generalidade das matérias-primas, importante componente das importações chinesas do Brasil e países africanos lusófonos, a par do abrandamento económico global, aumenta
a incerteza sobre qual a evolução no ano que agora começa.
Ainda assim, as trocas comerciais com Angola parecem ser uma história de sucesso para todos os parceiros, com destaque para o Brasil, que até Outubro deste ano viu o valor da balança crescer para 3,6 mil milhões de dólares (2,56 mil milhões de euros), com expressivos aumentos das importações angolanas (55,4 por cento), mas sobretudo das exportações (126,6 por cento).
As trocas com Portugal cresceram “modestos” 30 por cento em cada sentido, para perto de 1,9 mil milhões de euros até Outubro, enquanto a balança sino-angolana cresceu 122 por cento, para 2,3 mil milhões de dólares (1,63 mil milhões de euros).
Entre os “oito”, Angola parece ser até agora o país que mais urgência tem em fazer contas, na presente conjuntura: o petróleo, base da sua economia, está a negociar actualmente a um terço do valor de meados de 2008, e muito abaixo do valor em que o Ministério das Finanças angolano se baseou para elaboração do Orçamento de Estado de 2009.
Foi neste contexto que o presidente angolano, José Eduardo dos Santos, fez em Dezembro a sua segunda visita à China em apenas cinco meses, de onde trouxe uma “prenda de Natal” no compromisso do Eximbank em “expandir a cooperação com o Ministério das Finanças angolano”.
O plano de investimentos de Luanda para o próximo ano, que compreende a continuação da reconstrução de grande parte das infra-estruturas destruídas durante a guerra civil de mais de duas décadas, está avaliado em 42 mil milhões de dólares, mas poderá ser revisto face à actual conjuntura.
Até meados do ano, com investidores angolanos e o “fundo soberano” Sonangol a multiplicarem-se em aquisições e aplicações financeiras por todo o mundo, de forma mais visível em Portugal, ninguém poderia imaginar a actual situação; para Luanda a questão era fundamentalmente como aplicar as brutais receitas petrolíferas dada a pouca capacidade de absorção da ainda incipiente economia interna.
O agudizar da crise financeira internacional ditou também perdas consideráveis nessas mesmas aplicações financeiras, embora tenha permitido a Luanda passar a ter uma palavra a dizer em empresas estratégicas portuguesas e angolanas que até agora detinham quase exclusivamente capital estrangeiro.
Poderá ascender a 935 milhões de euros a desvalorização total dos activos adquiridos pela Sonangol em Portugal no último ano e meio, de acordo com contas apresentadas do Diário Económico, em Lisboa.
Tendo em conta um preço médio de 2,3 euros por acção do Millennium Bcp, o investimento da petrolífera estatal angolana na aquisição de 9,99 por cento do maior banco privado português terá ascendido a 1.000 milhões de euros; à actual cotação das acções do banco, a menos-valia potencial ronda os 680 milhões de euros.
Na Galp, refere o jornal, a perda potencial ronda 250 milhões de euros, no último ano e meio, elevando o total de perdas para acima dos 930 milhões de euros.
Mais recentemente, Isabel dos Santos, filha do presidente angolano, pagou perto de 164 milhões de euros ao Millennium Bcp para comprar 9,7 por cento de outro importante banco português, o BPI, do qual é agora um dos principais accionistas, a par de importantes actores da finança global, como a Allianz, os espanhóis da La Caixa e o brasileiro Itaú.
Esta operação parece ter sido o epílogo da chamada “angolanização” da banca de Luanda, processo que permitiu a Angola, um dos mais promissores mercados financeiros emergentes, e a investidores privados angolanos assumir nos últimos dois anos participações praticamente equitativas nalguns dos maiores bancos do país (BFA, BESA) e noutros com grande potencial de crescimento (Millennium Angola, Totta Angola), antes controlados por capitais estrangeiros, e mesmo passar a ser accionista de referência das “casas-mãe” em Lisboa.
O “crescendo” angolano não tem como Lisboa o único destino, mas parece privilegiar os países africanos lusófonos, com destaque para São Tomé e Príncipe, onde a Sonangol assumiu uma participação maioritária na petrolífera local Enco, e em Cabo Verde, onde a petrolífera angolana já controla a distribuidora de combustíveis Enacol, e onde os bancos de Luanda têm vindo a implantar-se o último dos quais o Banco Africano de Investimentos (BAI).
Paralelamente, a cargo de uma comissão instaladora nomeada pelo próprio Presidente, arrancou a criação do Fundo Soberano de Angola, que visa estabelecer mecanismos que “garantam uma gestão eficiente dos recursos e protejam o país das vulnerabilidades externas e dos ciclos económicos conturbados”, segundo escrevia recentemente a AngolaPress.
O findo ano de 2008 marca também o início da parceria entre a Sonangol e a Geocapital, baseada no sector financeiro angolano, mas que poderá abrir-se em breve a todo o espaço de negócios lusófono, em particular aos projectos energéticos.
Duas participadas da Sonangol (Banco Privado Angolano e Global Pactum) ficarão com maioria (50,01 por cento) da sociedade conjunta, a Geopactum, cabendo o restante à “holding” de Macau, que entrará também no Banco Privado Atlântico (BPA), com cerca de 10 por cento, participação idêntica à que os portugueses do
Millennium Bcp estão em vias de assumir na mesma instituição bancária controlada pela Sonangol.
Uma primeira implicação da concertação entre Sonangol e Geocapital é no mercado bancário português: uma vez que os angolanos detêm 10 por cento do Millennium Bcp e Stanley Ho cerca de 3 por cento, tornam-se uma “força” considerável dentro do maior banco privado português.
Em curso está já um levantamento estratégico do potencial eléctrico angolano, recorrendo ao ‘know how’ da Companhia de Electricidade de Macau, empresa participada por Stanley Ho e pela portuguesa EDP.
A cooperação poderá estender-se também aos biocombustíveis, uma vez que a Geocapital pretende investir perto de 40 mil milhões de dólares, até 2018, na produção de biocombustíveis na África de língua portuguesa.(macauhub)